domingo, 21 de março de 2010

Vultos

As ruas do teu lado do mundo estão cheias de vultos vazios, apenas lembranças que não passaram aquele gosto dos finais belamente alocados em nossos corações inquietos cheios de nostálgicas e dopaminérgicas pulsações. Teu rosto é um vulto do céu.

Minhas musicas estão lotadas de vultos que não são meus, que chegam aos ouvidos, turvos, ambos, zumbem e, dessa forma, continuam morando dentro de mim mesmo sendo estrangeiros, vultos visitantes vindos de longe. Meus ouvidos são vultos calados.

O meu próprio lugar em teu mundo é um vulto, quase como se só eu pudesse vê-lo, como um fantasma. Já ouvi histórias desses lugares assombrados, vazios, como peitos vagos, vagos contos que nos levam antes de nossa vontade a desaparecer no ar. Meu lugar é um vulto.

Te enxergo como se não existisse porque minha visão se mancha, se embaça, se mistura como folhas soltas ao vento, porque assim é mais fácil o vento levar-te. Como nuvem que és. Meus olhos são vultos de árvores ao vento.

E todas essas palavras? São só vultos, vou deixá-las passar, assim temerei menos seus gritos abarrotados e meus sussurros impacientemente tristes, deixados mortos, tapados.

Teu vulto é um só, não há como imprimir qual seria o melhor dos tons para tua voz, ela me some, me desaparece em meio a multidão sólida. Somes como bobagens, como aquelas antigas canções findadas.

Vultos de tua voz. Vultos de teu sol eclipsado. Vultos do céu em teus olhos. Vultos das nuvens em tua pele. Vultos perdidos em teu caminhar. Vultos em borboletas espalhafatosas. Vultos em abraços despertos. Vultos em LPs cansados. Vultos em meio à solidez da hora do almoço. Vultos engraçados. Vultos nos dedos estalados. Vultos perdidos, ralhados.

Aonde foram todos esses vultos? Como desaparecem assim? Na chuva? Nas lágrimas? No descontrole?

Ficarei insistente no alto volume dos vultos vazios do outro lado do mundo.

3 comentários:

Deyse Nara disse...

Nós: vultos desse mundo que jaz necrosado e vazio!

=**

Mandy disse...

Vultos são tão abstratos, e ainda assim dão tanto medo =|

Klécia Melo disse...

E enquanto eu temer a quem me assombra, isso vai ser sim maior que eu...
Ter medo é bastante aceitável. Não é aceitável não enfrentar o que te assusta. Os vultos nossos de cada dia.
Muito bom o texto!