sábado, 24 de outubro de 2009

Erro

Erro por sono
Erro pulsão
Erro por ser são
Erro por sessão
Erro possessão
Erro por ser som
Erro por secção
Erro seção
Erro por ser tom
Erro propulsão
Erro por teu não
Erro meu chão

Erro por ser erro
Erro por ser errado
Erro ainda calado

Erro por dedo
Erro por medo
Erro por ser cedo
Erro azedo

Erro doce como se fosse assim caído ao seu mundo invertido
Erro alegre, riso de jóia noturna, tirada de baú de erro contido.

quinta-feira, 22 de outubro de 2009

Voltarei, ele disse,
irei por necessidade extrema, porém,
ainda amo-te, amo-te como se fosse você
a amar-me,
amo-me a ti, e por isso, assim deve ser.

E se souberes a força que vi
As coisas que preparei e cresci
Jogarias pro ar
Constelações cairiam no mar
E quando tudo isso acontecer
Quando, crescido, acolher
Meu coração no teu
Saberás que a promessa que fiz
Não poderia ser quebrada
Dádiva do sacrifício que nos uni
Entenderás não ter estado abandonada
E apenas acordada
Despertará

sábado, 17 de outubro de 2009

Me atrasei dentro de mim

Cedo ou tarde me colocarei em desvantagem por não descobrir como eu posso virar vaso de flor, não descobrirei por pura sorte e por querer não descobrir, não querer achar e então, perdido, acabarei atrasado dentro de mim.
Cedo acordei por pensar que era tarde e então voltei a dormir o sono dos vigiados de perto, o sono daqueles todos que ouvem música ao sonharem, voltei a dormir as sapatilhas de bailarina de uma filha, voltei a sonhar os cantos dos interruptores e acabei me atrasando dentro de mim.
Foi tarde do dia que a noite passou despercebida. Foi há muito tempo que o tempo parou para ajudar a levantar, não há como ajudar a levantar sem parar. Foi nas fichas de fliperama e nos números entre um e doze que acabei atrasando dentro de mim.
Havia CDs e LPs espalhados por todos os cantos da casa quando os cantos da casa anunciavam a vida que viria embalada em papel de jornal. Havia imagens e recordações penduradas nos dedos das mãos quando as engoli como morango. Não importava o quanto espalhava as coisas penduradas, acabava me atrasando dentro de mim.
Aprendi cochilando as regras dos jogos mais complexos. Jogos de amar. Cortei com as mãos tudo que esperei pelo tempo que joguei. Não eram só jogos, nunca foram nunca serão, mais pareciam labirintos, e, quanto mais os adentrava e procurava saída, mais eu me atrasava dentro de mim.
Tentei encontrar saída e me atrasei dentro de mim, vasculhei atrás dos quadros a procura dos perfumes passados e me atrasei dentro de mim, tentei acender lâmpadas que não estavam lá depois da ceia e me atrasei dentro de mim, tentei chegar na hora certa de voltar, mas me atrasei dentro de mim.

segunda-feira, 12 de outubro de 2009

Economia

Economizo beijos
Para guardá-los
E esquecê-los.
Economizo rugas
Envelhecidas curvas
E desejos.

Economizo lampejos
Os obedeço
Deixo voarem.
Economizo despejos
Deixo ficar
Espero, fatalmente, desabitarem.

Economizo corridas
Fico devagar
Vagar vagas lembranças.
Economizo figuras
Digo certeiro
Às entendidas crianças.

Economizo dias raros
Da parede-memória
Irrisórios e caros.
Economizo amores perfeitos
Como se fossem dizer,
Como se fossem inteiros.

Economizo raios e trovões
Que anunciam as multidões
A vida!
Economizo veios
Estradas passadas,
Bocas vidradas.

Economizo asas.
Economizo folhas.
Economizo ventos.
Economizo tempos e escolhas.

Economizo ecos
Para não ficar voz
Não se fazer nós

Economizo economias
Pra deixar a vida...

sexta-feira, 2 de outubro de 2009

Não mais

Não mais endereçarei minhas cartas. Anônimo eu não serei mais, mas, quem se dispuser a recebê-las, secreto não será mais o admirador, o tempo que está por vir faz não conhecida qualquer que seja a caixa de correio que se configurará morada breve, qualquer que seja o relicário que se transformará em asilo de letras mal feitas, ou museu de documentos antigos, de curador esquecido, pelo tempo, engolido.

Não mais saberei se é certo fazer concreto um pobre sonho, não que ele seja pobre de detalhes, detalhes não faltam nas histórias criadas durante o sono, o sonho é pobre porque é generoso demais. Ele se dá a quem sonha. O sonho se dá ao sonhador. Não mais terei tal certeza, não porque deixarei de sonhar, mas porque deixarei o concreto pelo caminho, não construirei nada com ele.

Não mais descobrirei janelas em paredes tortas, todas serão quadros de Monet ou outro famoso francês, nem reestruturarei meus castelos no céu depois de ruídos e espalhados em nuvens acinzentadas, os deixarei chover.

Não mais me acharei em estrelas alheias. Um ponto no escuro ralhar dói nos olhos, na retina do coração, mas é uma dor boa, dor de mudança, mudar cones e bastonetes. Acharei o silencio, um silencia em mim, que me levará novamente a tranqüilidade das paisagens bucólicas.

Não mais continuarei nessa história, não porque ela não tenha acabado, ela acabou inacabada e é por isso que saio sem despedidas espetaculares, só com palavras de adeuses mal ditos que são , por si só, espetacularmente tristes do meu ponto de vista. Não vou mais desabafar na imaginação que um dia foi tudo que tive, não, não mais.

...

Não, mas as cartas você um dia lerá, publicarei em algum livro por pura diversão.

Vou fechar sem piedade as janelas que não soprarem som, assim como o sonho que não se der.

Não mais tentarei entender teus sinais que não cabia entendimento e que eu lutava para guardar, nem a tua caligrafia que eu imaginei arredondada. Não mais tentarei guardar teus olhos que eu sonhei amendoados.

Não mais.